Saiba quais familiares têm direito aos bens de uma pessoa que faleceu sem deixar testamento e entenda as regras da partilha legal.
Quando alguém morre sem elaborar um testamento, a distribuição de seus bens segue uma ordem estabelecida pela legislação brasileira. Essa hierarquia de herdeiros está prevista no Código Civil e leva em consideração o grau de parentesco, além do regime de bens do casamento ou união estável.
Conhecer esses critérios é essencial para evitar conflitos familiares e atrasos no processo de inventário. A legislação brasileira determina que alguns familiares têm direito garantido à chamada herança legítima, independentemente da vontade do falecido.
Quem são os herdeiros necessários segundo a lei?
De acordo com Max Bandeira, sócio do Bandeira Damasceno Advogados, os herdeiros necessários incluem descendentes (filhos, netos), ascendentes (pais, avós) e o cônjuge sobrevivente. “Essas pessoas sempre terão direito à metade do patrimônio do falecido, conhecida como legítima, mesmo que exista testamento”, afirma o especialista.
A ordem de prioridade na sucessão legítima
Na ausência de um testamento, a partilha dos bens obedece a uma sequência específica, conforme detalha o advogado. As etapas da sucessão são:
1. Descendentes em conjunto com o cônjuge (em alguns regimes de bens)
Se o falecido deixou filhos ou netos, a herança será dividida entre eles e o cônjuge, dependendo do regime de bens. Por exemplo, em caso de casamento sob o regime de comunhão parcial, os bens particulares serão divididos igualmente entre o cônjuge e os filhos. Se houver dois filhos, cada um, junto com o cônjuge, terá direito a um terço dos bens particulares. Já no caso de bens comuns, o cônjuge recebe 50% como meação e os filhos dividem os outros 50%.
2. Ascendentes com participação do cônjuge
Na falta de descendentes, os pais ou avós do falecido entram na linha sucessória junto com o cônjuge. Por exemplo, se uma pessoa falece deixando pai, mãe e cônjuge vivos, cada um receberá um terço da herança. Caso reste apenas um dos pais, a partilha será feita em partes iguais entre ele e o cônjuge, com 50% para cada.
3. Cônjuge sobrevivente quando não há descendentes ou ascendentes
Se não existirem filhos, netos, pais ou avós, o cônjuge tem direito à totalidade dos bens deixados. Em uma situação como essa, se José falece sem filhos ou pais vivos, sua esposa Marina herdará 100% do patrimônio, independentemente da existência de um testamento.
4. Parentes colaterais até o quarto grau
Na ausência de descendentes, ascendentes e cônjuge, a herança será destinada a parentes colaterais, como irmãos, sobrinhos, tios e primos. Por exemplo, se Maria falece deixando dois irmãos germanos e um meio-irmão, a divisão será feita conforme a lei: 2/5 para cada irmão pleno e 1/5 para o meio-irmão.
5. Destinação dos bens ao Estado
Se não houver nenhum herdeiro dentro das categorias anteriores, o patrimônio será recolhido ao Estado após o devido processo legal. Isso ocorre em casos em que não há parentes até o quarto grau nem cônjuge sobrevivente.
União estável e os direitos na sucessão
Embora o Código Civil mencione apenas o cônjuge, decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) ampliaram esse direito ao companheiro de união estável. Conforme explica Max Bandeira, se a união estável for reconhecida legalmente, o companheiro sobrevivente terá os mesmos direitos sucessórios que um cônjuge.
Além disso, o regime de bens adotado pelo casal também influencia na divisão da herança. Na comunhão parcial, por exemplo, o cônjuge tem direito à meação dos bens comuns e só participa da herança caso existam bens particulares do falecido.
Em casamentos regidos pela separação obrigatória de bens – como os celebrados por pessoas com mais de 70 anos – o cônjuge não concorre com os descendentes na herança.
Inventário é obrigatório mesmo sem testamento
Independentemente da existência de testamento, o inventário é um procedimento necessário para formalizar a transferência de bens aos herdeiros e apurar eventuais dívidas deixadas pelo falecido. Eduardo Brasil, sócio do Fonseca Brasil Advogados, esclarece: “O inventário é imprescindível para garantir o acesso legal dos herdeiros ao patrimônio”.
O prazo estabelecido pelo Código de Processo Civil para dar entrada no inventário é de dois meses após o falecimento. Conforme alerta a advogada Cléa Duarte, estados costumam aplicar multa sobre o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) em caso de atraso.
Principais erros no processo de partilha
Segundo especialistas, um dos equívocos mais recorrentes é a tentativa de realizar a divisão de bens de forma informal, sem a abertura de inventário. Eduardo Brasil ressalta que, sem esse processo legal, não é possível transferir formalmente nenhum bem, o que pode causar problemas jurídicos e conflitos familiares.
Outro erro frequente é a omissão de herdeiros ou de bens existentes, o que pode gerar prejuízos financeiros e perda de direitos sucessórios.
Cléa Duarte reforça: muitas pessoas confundem a ausência de testamento com a desnecessidade de inventário. “O testamento é opcional, mas o inventário é uma exigência legal para qualquer tipo de partilha, inclusive para o cumprimento de eventuais disposições testamentárias.”
Como ficam as dívidas deixadas pelo falecido?
Em relação às dívidas, a legislação determina que elas sejam pagas com os bens que integram o espólio, ou seja, o conjunto de bens deixados. Eduardo Brasil esclarece que os herdeiros não são obrigados a quitar essas dívidas com recursos próprios.
Caso o valor das dívidas ultrapasse o total dos bens herdados, a diferença é considerada extinta, sem gerar responsabilidade financeira aos herdeiros.